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(2008/2009)
ENCONTRO COM PRÍNCIPES DA SELVA

Alguém apelidou um dia de “Príncipes da Selva” os caçadores guias que durante a época de ouro dos safaris de caça em Moçambique (1960/1975) foram os responsáveis pelos sucessos das caçadas de figuras ilustres do mundo das finanças, da política, da ciência, das artes, etc. As empresas e os privados concessionários das coutadas e das zonas livres de caça receberam aqui famosos e ricos homens do petróleo, da indústria automóvel, astronautas, actores de cinema, escritores, cientistas, chefes de governo, empresários, etc., que vieram caçar dos melhores troféus, muitos deles recordes mundiais que tornaram famoso o território como dos mais importantes em fauna bravia africana! 
O mítico e pomposo nome de White Hunter (caçador branco), criado nesses países para identificar precisamente os guias dos safaris de caça, conferiu a estes profissionais o estatuto de figura de confiança dos turistas-caçadores, que dos mais variados pontos do mundo se deslocavam a África, terra de negros, para realizarem as suas caçadas. Na gíria, pode ainda utilizar-se esta designação, mas desde a década de 70 que os clubes e organizações internacionais ligadas à caça, e de uma forma geral toda a imprensa da especialidade, por razões óbvias, aboliram a mesma. Passaram a chamar-se de Professional Hunters !

E porque já biografei de algum modo estes dois amigos, pouco me resta dizer deles se não acrescentar que ambos continuam activos, mais o Sérgio que com os seus 55 anos está praticamente no auge da sua vida profissional e divide a mesma entre a caça, a pesca, a caça submarina, a pintura e a escrita. Depois da publicação, em 2005, do seu primeiro livro “ O Cântico da Galinha do Mato”, prepara agora a publicação das narrativas do seu trabalho junto dos americanos, onde viveu os dramas das populações vítimas do flagelo dos leões e abateu dois destes felinos! Um trabalho cujo manuscrito acabei de ler e me fascinou bastante, não tanto pelo relato dos acontecimentos que são muito comuns aos que vivi durante a minha carreira profissional, mas pelo sentido poético muito especial que o Sérgio imprime às suas narrativas.
Menor actividade como caçador-guia tem tido o Rui Quadros, que se virou para outras actividades mais consentâneas com a sua idade (já na casa dos 70) e só esporadicamente pega nas armas e bagagens para um ou outro safari, sobretudo para acompanhar antigos clientes que continuam a requisitar os seus serviços!
Como complemento desta “Carta”, deixo aqui os links dos trabalhos que publiquei anteriormente sobre estes dois "príncipes da selva", particulares amigos que muito estimo!
http://faunabraviademocambique.blogspot.pt/2010/05/79-cacador-guia-rui-quadros-minha.htmlREPORTAGEM FOTOGRÁFICA
Placa da rua da Massala, no Bairro do Triunfo, onde vive o clã Veiga


Saudações amigas, aqui da beira do Índico
Maputo, 25 de Dezembro de 2008.
Celestino (Marrabenta)
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UM PASSEIO À INHACA
Várias tentativas falhadas de ir à Inhaca levaram-me a admitir que teria de regressar ao velho continente com mais uma frustração no que às viagens fora de portas diz respeito!
Valeu ter prolongado a estadia em Moçambique muito para além do previsto para que a tal oportunidade acabasse por surgir. Um telefonema já noite adiantada do Sérgio Veiga, anunciava-me a viagem para o dia seguinte, aproveitando um passeio turístico com dois clientes portugueses.
Antes das 7 lá estava na casa deste velho amigo, em pleno Bairro do Triunfo, onde ele e seu ajudante já estavam nos preparativos para meter o barco na água, ali mesmo em frente. Para além dos 5 ocupantes, também o “Gunga”, um bonito perdigueiro inseparável companheiro da caça e da pesca do Sérgio, tomou lugar no bote.
O mar estava calmo e brilhava como um espelho! Só a neblina matinal nos roubou o belo espectáculo da cidade, que deixamos para trás e aos poucos ficou reduzida às silhuetas dos grandes prédios recortadas no horizonte. Pela frente foi-se divisando a imagem das duas ilhas, com a dos Portugueses a fundir-se na vizinha Inhaca.
Uma hora de viagem estupenda e estávamos lá, em plena praia fronteira ao acampamento do Sérgio, uns bons quinhentos metros à direita do complexo turístico da Ilha. O programa não permitiu mais tempo ali do que o suficiente para trocar de roupa e colocar apetrechos de pesca e mergulho no barco.
Contrariando os restantes companheiros, que dispensavam comer algo, lancei mão de duas latas de salsichas que faziam parte da minha bagagem de comezainas (que levei e à socapa) e pedi ao cozinheiro para as preparar rapidamente. A fome que tinha dava para devorar qualquer daqueles avantajados mata-bichos de garfo dos velhos tempos das minhas andanças pelo mato!
Já estavam todos de novo a bordo para o périplo às ilhas, reclamando a minha presença, quando peguei na frigideira ainda no fogo e corri com ela para junto dos meus companheiros oferecendo a cada um (incluindo ao “Gunga”), uma bela e bem quentinha salsicha. Ninguém se fez rogado e lá fomos mar a fora mastigando o belo manjar, que foi providencial já que o regresso ao acampamento aconteceu apenas pelas 4 da tarde, altura em que recarregamos os estômagos com um belo caril de lulas!
Há mais de dez anos que não visitava a Inhaca e as recordações que conservava não eram de todo agradáveis, já que da última vez que lá estive esta ilha estava ainda sob grande pressão de uma elevada população humana que ali se refugiara durante o período da guerra civil. Actualmente encontram-se ali cerca de seis mil pessoas, distribuídas sobretudo pela orla costeira e que são ainda um peso excessivo para a capacidade da ilha relativamente à agricultura e aos produtos do mar, considerando que se trata de uma reserva natural onde apenas a indústria do turismo deveria ter lugar.
Estou a falar de um dos poucos “intrusos” extra população local que desenvolvem na Inhaca actividades turísticas. Há mais de trinta anos que ele tem base de apoio na ilha para as suas incursões piscatórias e de caça submarina fora da zona de reserva e para os mergulhos nos locais de observação das grandes espécies marinhas. O Sérgio conhece como ninguém esses locais, que ajudou a preservar como santuários dessas espécies e que são uma atracção turística, aqui mesmo às portas da capital. O passeio que ele nos proporcionou durante um único dia, só foi possível pela sua grande experiência e conhecimentos desta região.
A segunda fase deste passeio incluiu uma paragem junto do velho navio afundado, para alguns mergulhos e observação das espécies. Isso foi feito apenas pelo Sérgio e pelo seu cliente mais novo, atendendo à profundidade das águas e aos cuidados a ter com os tubarões, frequentadores desse local para caçarem os grandes peixes que ali procuram abrigo.
Navegamos depois pelo lado oriental da ilha dos Portugueses e a meio desta, onde a paisagem mais se parece com um deserto africano de areias, fundeamos de novo para nos deliciarmos com mergulhos em águas calmas e límpidas.
Pelas cinco e trinta da tarde iniciámos o regresso à capital, mas as condições do mar eram já bem diferentes. Levantava-se o bem conhecido vento sul que normalmente assola a baía ao fim do dia e que obriga a viajar sob ondas crispadas e muito inconvenientes para as pequenas embarcações como a nossa. A viagem durou mais meia hora do que o previsto e ocorreu sob o constante chapiscar das ondas que nos encharcaram até à medula, não obstante os impermeáveis que usamos.
O regresso do belo passeio à Inhaca foi de facto um autêntico suplício que só terminou em areia firme frente ao Bairro do Triunfo, pelas 19 horas. Só o Sérgio e o seu ajudante se mostravam tão serenos como se tivessem feito a travessia da baía em águas tão calmas como aquelas da viagem de ida. Até o “Gunga” aparentava enjoo!
Mas valeu a pena, pelo dia inesquecível que passamos na lendária e muito bonita ilha da Inhaca!
Maputo, Março de 2005
Celestino (Marrabenta )
NOTA: Esta “Carta” foi inserida em 19-03-2005 nas seguintes Comunidades da Internet: http://www.groups.msn.com/Beira
http://www.groups.msn.com/Inhambane http://www.groups.msn.com/LourençoMarques/MaputoMoçambique
http://www..groups.msn.com/Rogertutinegra


















































